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by Brunelson

Pearl Jam: resenha do álbum "Vitalogy"


Pearl Jam

No final de 1994, PEARL JAM lançava o seu 3º álbum de estúdio, “Vitalogy”.


Seguindo a linha de raciocínio adotada pela banda após o término do furacão que foi a turnê do seu 1º disco, assim como todo o pacote midiático que originou para a banda, o disco “Vitalogy” consegue ser ainda mais depravado, degenerado e ácido do que o 2º álbum do grupo, sendo que aqui a mensagem também é passada com muita energia e fúria além de nos apresentar canções com arranjos musicais mais simples e crus, em relação aos 02 primeiros discos - e músicas totalmente anticomerciais banhadas em experimentalismos, "noise" e microfonias.


Lembrando que a banda não fez nenhum videoclipe de qualquer música para esse álbum (assim como também aconteceu no 2º disco e que era lei nos anos 90 lançar clipes na MTV para promover o seu novo álbum de estúdio, a não ser que a banda quisesse se auto sabotar), sem contar ainda na insistência do grupo em não querer dar entrevistas, aparecer na TV, na rádio e aos holofotes, justamente para preservar a sua identidade, sanidade e sobrevivência.


Só para aproveitar a deixa, a música “Betterman” (lançada no disco "Vitalogy") havia sido considerada uma flagrante canção de sucesso pelo produtor Brendan O’Brien, sendo que o grupo estava relutante em grava-la e inicialmente rejeitando-a ainda no 2º disco da banda, devido a sua acessibilidade.


É aqui nesse disco que a banda nos apresenta as suas primeiras músicas punk rock de ser. Estilo que apareceu timidamente no seu 2º álbum, mas que aqui elas já mostram a sua cara e começam a deixar de lado aquelas músicas do PEARL JAM mais funk rock dos 02 primeiros discos.


Este é um dos motivos, musicalmente falando, que muitos fãs do PEARL JAM não curtem tanto assim mais a banda hoje em dia, pois eles preferem aquele estilo musical antigo do grupo. Muitos criticam o estilo punk rock do PEARL JAM em fazer as músicas mais pesadas atualmente e é uma opinião que temos que respeitar...


Mas assim como tudo nessa vida, as coisas mudam, avançam, evoluem e envelhecem.


Bem aventurados os que possuem um facão na mão para desbravar a mata fechada que nos cerca, que conseguem abrir um caminho podendo enxergar o horizonte com outros olhos e perspectivas. Estas revelações são válidas para todo e qualquer sentido, que seja para sempre estar evoluindo o seu som inventando coisas novas (e aceitar dentro de si tendo consciência dessa verdade) ou para continuar levando o mesmo tipo de som aperfeiçoando os arranjos, velocidade, harmonias vocais, melodias, dinâmicas e composições líricas e musicais (e aceitar dentro de si tendo consciência desta verdade também).


Não há nada de errado/certo/superior/inferior em seguir um desses 02 caminhos e para amarrar esses 02 laços, ambos podem ser realizados (na maioria das vezes) para satisfazer primeiramente o desejo interno real e sincero do músico em questão, a sua pulsão de vida em particular, as suas ideias subjetivas e conscientes, a realização dos seus desejos inconscientes, a criação do seu chiste e para ser livre e feliz com o que lhe dá sustento...


Esta atitude do músico em escolher um desses 02 caminhos nós temos que respeitar, deixando livre e respeitar também a opinião de cada ouvinte ou quem se diz ser fã da banda em relação a essas mudanças que não lhes agradam...


As músicas punk rock descaradas nesse álbum e que são tocadas em “power chords” por pelo menos 01 guitarra, são as canções “Spin The Black Circle”, “Not For You” (apesar de não ser uma levada rápida, sendo que os RAMONES também mandam saudações aqui), “Whipping” (sendo que essa música havia ficado de fora do 2º disco da banda) e “Corduroy”.


Em contra partida, ainda sobrou um filhote do funk rock nesse disco, não tão assim funkeada por estar também flertando com o punk rock, mas que o baixo de Jeff Ament não consegue negar as suas origens, que seria a música “Last Exit”.


As 02 únicas músicas funk rock mesmo são as canções “Out of My Mind” e “Anything in Between”, mas ambas não acabaram entrando no álbum.


As músicas experimentais da banda que aparecem aqui e que de 14 faixas que esse disco possui o grupo escolheu abusar (no bom sentido) de 04 para incluir as suas viagens sonoras, são as canções: “Pry To”, “Bugs”, “Aye Davanita” e “Hey Foxymophandlemama, That’s Me”. Seria aquele aceno sarcástico para o mainstream e para aqueles que até hoje estão esperando por um novo “Ten” (1º álbum, 1991), do tipo: “Esta sonoridade não é para vocês! Se quiserem continuar a nos seguirem, tudo bem, porque a banda está se transformando nessa coisa agora, mas se não quiserem também...”


Estes experimentalismos a banda já havia nos mostrado em uma breve prévia no seu 1º disco, deixando ausente no 2º álbum e que iria permear ainda mais alguns discos da banda no futuro...


E antes de entrarmos na questão das letras, o PEARL JAM nos dá um belo exemplo fazendo honrarias sinceras ao hard rock com a música “Satan’s Bed”.


É nesse álbum que o vocalista Eddie Vedder começa a puxar para si a criação de novas músicas, saindo um pouco daquela supremacia dos 02 primeiros discos da banda que existia entre o baixista Jeff Ament e o guitarrista Stone Gossard. Este é outro motivo apontado pelas pessoas que não curtem mais tanto assim a banda nos dias de hoje, por sentirem falta daquela química que havia entre Jeff e Stone em compor as músicas, sendo que a partir do álbum “Vitalogy”, algumas canções começaram a vir prontas para o estúdio não mais havendo aquela confluência - no sentido de composições e porque não, também no sentido pessoal/relacionamentos internos entre os membros do grupo.


O produtor desse disco, Brendan O’Brien (que também havia gravado o 2º álbum da banda), ainda havia destacado em uma entrevista naquela época que as sessões de gravação do disco “Vitalogy” foram muito tensas, como se algo fosse implodir.


Continuando com aquela mesma fórmula dos álbuns anteriores, as músicas que falam agora sobre histórias de outros personagens são as canções “Nothingman”, “Betterman” (esta música alcançou o 1º lugar na Billboard e nem foi single do álbum), “Immortality” e “Falling Down” (esta pérola também não foi incluída no disco, mas em 2010 ela ganhou o seu lançamento no single de natal da banda).


E já que esse álbum não nos apresenta aquelas canções únicas com o cunho político e social engajados na sua essência, na verdade elas aparecem “camufladas” nas músicas que falam sobre Eddie e que serão levantadas no parágrafo seguinte. Mais uma característica refletida pelo atual novo posicionamento de Eddie na banda e como um “viajante” trilhando por novos caminhos...


Portanto, já que Eddie aparece compondo mais músicas nesse disco, consequentemente surgem mais canções que falam sobre o próprio Eddie, mas aqui ele não se expressa daquela forma pessoal como foi nos 02 primeiros álbuns da banda, demonstrando aquela expressão introspectiva de antigamente, mas sim, se colocando agora no ataque, projetando e mirando o alvo para terceiros. Esta é a nova posição de Eddie agora...


Passado as experiências humanistas e existencialistas que caminharam naturalmente nos 02 primeiros discos (cada uma ao seu devido tempo) e que moldaram a personalidade de Eddie e da banda, aqui no disco “Vitalogy” as letras que falam de Eddie são demonstradas dessa outra forma já citada de mãos dadas a uma forte ênfase também contra o sistema. As músicas que refletem esse prisma são as canções “Last Exit”, “Not For You”, “Tremor Christ”, “Whipping”, “Pry To”, “Corduroy”, “Bugs”, “Satan’s Bed”, “Out of My Mind”, “Anything in Between” e “Open Road” (esta última canção também ficou de fora do álbum e poderia tranquilamente ser uma música do MAD SEASON, já que estamos falando da mesma época. Será uma composição do guitarrista Mike McCready)?


Neste álbum, Eddie ainda está procurando a sua rota de fuga com um poder lírico do mesmo nível em comparação aos 02 primeiros discos, apesar de agora ele já estar externando diretamente aos seus opositores todos os seus recursos, atitudes, julgamentos, conclusões, discernimentos e provas vivas de tudo o que a banda passou e que pôde sancionar nessa cruzada até aqui...


O grupo conseguiu enxergar como a coisa começou e onde essa coisa se meteu, sendo que agora eles estavam lutando pela sua independência refletida tanto nas letras das músicas desse álbum quanto à nova sonoridade que a banda estava apresentando. E porque não também, declarada no título desse disco, fazendo um “Estudo da Vida” depois de tudo o que a banda havia passado e estava vivendo?


O próprio Stone Gossard falou em uma entrevista naquela época que no disco “Vitalogy” ele sentiu que o PEARL JAM era uma outra banda fazendo acontecer, sendo moldada agora também por Eddie Vedder.


Se o tema do 2º disco poderia ser resumido na palavra “confronto”, creio que o tema do álbum “Vitalogy” não se distingue muito do tema do 2º disco. Sim, ainda é um confronto e as letras das músicas comprovam isso, mas no 2º álbum a banda ainda estava na coleira latindo sem parar, querendo sair... Agora, a coleira foi quebrada sendo que o grupo tomou atitudes rebeldes (turnês por conta própria, mais afastamento da mídia, a criação da rádio Self Pollution Radio e etc) e verdades foram descobertas em todos os sentidos...


Então, creio que o tema do álbum “Vitalogy” seria a palavra: revolta! Lembrando que a banda ainda continuou com o seu boicote contra a Ticketmaster que havia se originado na turnê de verão no ano de 1994 pelo álbum “Versus” (2º disco, 1993) e que se estendeu durante a turnê do álbum “Vitalogy” em 1995.


Essa atitude pertinente da banda contra a Ticketmaster também foi um dos fatores que mexeu com a estrutura emocional dos membros do grupo refletindo nos seus relacionamentos internos. A iniciativa de se apresentarem em locais sem contrato com a Ticketmaster, os impediram de fazerem shows pela Ticketmaster nos EUA por quase 03 anos! Jeff disse em uma entrevista alguns anos mais tarde: “Nós fomos muito cabeças duras em relação à turnê de 1995. Tivemos que provar que podíamos excursionar por nós mesmos e isso meio que nos matou e quase matou a nossa carreira”.


Aliás, voltando ao quesito rebeldia/revolta, que belo exemplo seria a letra da música “Spin The Black Circle”, onde Eddie destaca uma homenagem e ode ao vinil justamente numa época onde o vinil estava extinto e os CD’s reinavam soberanos e únicos sobre a terra... Para reforçar mais ainda essa tese, o disco “Vitalogy” foi lançado 1º em vinil no mercado antes da banda lançar em CD e se tornou no vinil que mais vendeu cópias na história do rock por longos 20 anos, emplacando esse vinil entre os álbuns em CD’s mais vendidos daquela época nas paradas, só isso...


Lembrando que essa música ganhou o Grammy sendo que isso não teve muita importância pela banda.


E aproveitando a mesma atenção, outro exemplo dessa rebeldia foi o single da música “Immortality” que trouxe como lado-b a banda THE FROGS fazendo cover da canção do PEARL JAM, “Rearviewmirror” (lançada no 2º disco). Uma outra banda tocando no seu próprio single? Que belo acontecimento (sem ironia).


A catarse ainda não é totalmente intelectual aqui, está querendo nascer, principalmente pelas músicas que falam de Eddie, mas ainda é emocional com um verdadeiro desleixo e imediata revolta sônica - ambas no bom sentido.


Mudando de assunto agora e assim como já havia acontecido nos 02 primeiros álbuns da banda, é possível verificar mais composições que possui aquela levada tribal da bateria que iria ficar marcada em toda a discografia do grupo. As músicas “Tremor Christ” e “Hey Foxymophandlemama, That’s Me” (aproveitando para dizer que, se você quiser saber ou quiser querer entender um mínimo por cento de como funciona a mente de um esquizofrênico suicida, as entrevistas feitas aqui na letra dessa última canção junto com a sua sonoridade psicótica, podem lhe dar esse breve vislumbre) seriam as simpatizantes nesse disco, sendo que a 1ª não chega a ser 100% tribal e a 2ª se denota a partir da metade da música até o seu final.


Fica o destaque do vocal de Eddie na música “Tremor Christ” do começo ao fim, com a dinâmica do vocal indo ao ápice e terminando do jeito mais sensível e introspectivo possível. Esta questão do vocal nessa música citada é mais uma das marcas cravadas e que até hoje reluz forte no arquivo mental do sujeito, desde quando eu escutei esse álbum pela 1ª vez nas férias da escola de verão em fevereiro/1995, sendo que esse foi o tempo que demorou para que o disco chegasse aqui no Brasil naquela época...


Outra situação interessante é que no livro que acompanha esse álbum consta um poema que está escrito na página da canção “Aye Davanita”. Esta é uma daquelas músicas experimentais do disco e toda instrumental (com leves camadas vocais), mas mesmo assim, a banda resolveu colocar esse poema no lugar do que seria a “letra” dessa música dando a entender, quem sabe, algo que vai além do que uma simples música sem palavras a qual pode desencadear alguma visão na imaginação de qualquer ouvinte durante a sua audição. Este poema começa assim: “Ela deitou-se sozinha / Durante os seus melhores dias / Como uma obra de arte / Lendo nua na cama / Passado alguns dos seus melhores dias / Limpando o tapete dos seus cabelos / Passou os seus piores dias / Devido ao prazer de assumir a culpa / Passou toda a sua vida / Incrédula em seus piores medos / Uma obra de arte / Uma obra de arte...”


E falando em poema, chegamos à imortalidade...


Também no livro que acompanha o disco consta outro poema que está escrito na página da canção “Immortality”. Esta é uma bela e uma das músicas mais cativantes que o PEARL JAM já gravou em estúdio - e que também devido ao vocal surreal de Eddie e ao solo de violão de Mike, são sintomas que foram e estão fotografados na minha mente até hoje, desde quando eu escutei esse disco pela 1ª vez quando foi lançado.


A canção ainda é questionada até os dias de hoje pelos fãs da banda se a letra dela faz ou não referências à morte do ex-frontman do NIRVANA, Kurt Cobain?


Questionado na época se essa música era uma homenagem ao ícone grunge que havia falecido naquele mesmo ano, Eddie negou e nega até hoje a comparação... O incrível é que, lendo a tradução dessa letra escutando a música junto e embalado pelo vocal sensitivo e sincero de Eddie, junto com a sonoridade ora diminuta, ora crescente e numa dinâmica louvável da canção, a letra lembra muito sobre o fato ocorrido. Mais 01 detalhe: a 1ª vez que o PEARL JAM tocou essa música ao vivo foi no dia 11 de Abril/1994 na cidade de Boston, apenas 03 dias depois da notícia do falecimento de Kurt Cobain...


Este poema que está escrito na mesma página das letras da música "Immortality" começa assim: “Eu esperei o dia todo / Você esperou o dia todo / Mas você foi embora antes do pôr do sol / E eu só queria dizer a você / Que o momento estava lindo / Apenas queria dançar uma música ruim / Dirigir carros ruins / Assistir TV ruim / Deveria ter ficado para o pôr do sol / Se não fosse por mim...”


O baterista Dave Abbruzzese ainda participou da gravação desse álbum, com exceção da última música do disco (“Hey Foxymophandlemama, That’s Me” e que também é nomeada às vezes como “Stupid Mop”) que foi gravada pelo novo baterista da banda na época, o ex-RED HOT CHILI PEPPERS, Jack Irons.


Jack entrou na banda e fez a turnê desse álbum, e foi a mesma pessoa que havia entregado aquela 1ª fita demo do PEARL JAM a Eddie quando o grupo estava procurando por um vocalista (chamada “Mamasan”, para que Eddie gravasse os vocais em cima e que depois foi devolvida aos membros da banda para que eles aprovassem o vocal).


Os motivos da saída de Dave estão expostas na outra resenha que escrevi sobre o álbum “Versus” e foi clareada em uma entrevista histórica pelo guitarrista Mike McCready ao site Alternative Nation em 2013, se não me engano...


Esse é o disco “Vitalogy”... Assim como a fé sem obras de nada vale, aqui está um disco que reflete a fé e a crença de uma banda, as quais foram formalizadas e concretizadas empiricamente com atitude! São atitudes que poucas (algumas) bandas na história do rock’n roll tiveram a coragem de lançar no mercado, sem receio e temor do que poderia originar aos fãs, a terceiros e a si mesmos, independente também de qual feedback iria cair sobre eles...


Nota: o álbum “Vitalogy” foi o 2º disco mais vendido rapidamente na história do rock’n roll, com mais de 877 mil cópias vendidas em sua 1ª semana de lançamento só nos EUA. Ele perde o 1º lugar para o álbum “Versus”. O disco “Vitalogy” chegou ao 1º lugar no ranking da Billboard e figurou entre os Top 05 nos principais países da Europa e Oceania, além de ter ganhado incontáveis discos de Platina e de Ouro.


Track-list:


1- Last Exit 2- Spin The Black Circle 3- Not For You 4- Tremor Christ 5- Nothingman 6- Whipping 7- Pry To 8- Corduroy 9- Bugs 10- Satan’s Bed 11- Betterman 12- Aye Davanita 13- Immortality 14- Hey Foxymophandlemama, That’s Me



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