Alice in Chains: entrevista completa e resenha do álbum "Rainier Fog" pelo site Louder Sou
Segue a tradução completa da resenha e entrevista que o site Louder Sound havia feito com o ALICE IN CHAINS em 2018, na época do lançamento do álbum que seria indicado ao Grammy, "Rainier Fog" (8º trabalho de estúdio):
ALICE IN CHAINS voltou a Seattle pela primeira vez em 20 anos para gravar o disco "Rainier Fog". O resultado pode ser o álbum mais pessoal de todos...
Eles são sobreviventes. Dos grandes sucessos do grunge, apenas eles e o PEARL JAM permanecem desde o apogeu do som de Seattle que dominaria os anos 90, inspirando incontáveis artistas nas décadas seguintes.
Nos anos que se passaram, a banda se espalhou pelos EUA (o guitarrista Jerry Cantrell e o baixista Mike Inez moram no sul da Califórnia, o vocalista William DuVall em Atlanta e o baterista Sean Kinney ainda em Seattle), mas no verão passado todos voltaram para casa (Seattle) para trabalhar no novo álbum.
Mas Seattle não é apenas o lar do ALICE IN CHAINS - está profundamente gravada na história da banda e guarda muitas memórias, nem todas elas cor de rosa.
Em 1995, eles gravaram o seu álbum autointitulado (5º trabalho de estúdio) no estúdio Bad Animals (de propriedade de Ann e Nancy Wilson da banda HEART) - uma experiência que Jerry Cantrell descreve hoje como "uma gravação muito selvagem, bagunçada e no limite das coisas", quando ele volta às memórias para 1995, sentado à nossa frente em um sofá de couro.
Acabaria se tornando o último álbum do vocalista original Layne Staley. Agora com o nome de Studio X, a banda entrou naquele mesmo espaço 22 anos depois, esperando que nenhum fantasma do passado voltasse.
“Estávamos nos perguntando se aqueles fantasmas estariam lá quando chegássemos, mas muitos anos se passaram, somos uma unidade totalmente diferente em um espaço diferente e isso nunca apareceu”, disse Jerry. “Deixe as coisas na porta de entrada e vá trabalhar. Foi muito mais uma sensação boa estar em casa, gravando em nossa cidade natal e nos reconectando com o lugar de onde viemos”.
Jerry admite que foi uma "reconexão intencional" com a sua cidade natal e até teve um efeito no único remanescente da banda em Seattle, Sean Kinney.
Cantrell continuou: “Fizemos os dois últimos álbuns em Los Angeles e eu cansei de ficar em Los Angeles por longos períodos de tempo. Foi ótimo voltar para este estúdio, onde todos nós tínhamos nossos próprios pensamentos sobre como seria a sensação, além de ser uma coisa purificadora estar de volta lá... Foi mais um tipo de cura mesmo”.
O título vem do Monte Rainier em Seattle - o vulcão mais alto da costa oeste dos EUA. Para Mike Inez, também é como uma carta de amor para a região: “É geográfico, mas é mais uma sensação”, diz ele, alegremente. “É um lugar mágico para mim. Seattle tem aquela sensação sombria e nebulosa a maior parte do ano, mas quando estávamos gravando este álbum, o tempo estava fantástico todas as noites em uma cidade grande e próspera”.
Se lembrando da cena rock em Seattle ainda nos anos 80, Cantrell falou: “Antes que alguém de fora soubesse, já era legal pra caramba e todos nós lá em Seattle sabíamos disso. Beber cerveja com o guitarrista do SOUNDGARDEN, Kim Thayil, e ir a um show do BLACK FLAG juntos, ou ver o MUDHONEY se apresentando numa porra de uma garagem em algum lugar, ou nós abrindo para o MOTHER LOVE BONE em algum clube...”
À medida que Seattle se tornava um foco de criatividade, não demorou muito para a indústria se lançar. Nesta ordem, SOUNDGARDEN, MOTHER LOVE BONE e ALICE IN CHAINS estavam assinando com grandes gravadoras e de repente, esta pequena cidade do estado de Washington tornou-se mundialmente um fenômeno.
“Isso foi incrível e assustador ao mesmo tempo, porque você está saindo de um grupo local com status de banda de garagem, para ser a maior coisa do mundo, tipo, fazendo parte de um movimento”, disse Jerry, incapaz de conter a sua descrença até hoje. “Ainda é um conto de fadas, sabe? Eu fico emocionado com isso por causa de quanto tempo passou, quantos de nós não estão mais aqui, mas também como aquela música era potente e ainda vive... Esse era o objetivo de todos”.
Em 18 de maio de 2017, a voz de Seattle morreu. O vocalista/guitarrista do SOUNDGARDEN, Chris Cornell, tirou a sua própria vida aos 52 anos, enviando ondas de choque para a comunidade do rock. Ele foi um visionário, um ícone e um dos maiores cantores que o nosso mundo já conheceu. Falando com Jerry 01 ano depois, fica claro que ele ainda está profundamente afetado. Os dois eram bons amigos - Jerry escreveu e compôs a música "Rooster" do ALICE IN CHAINS na casa de Chris, quando ele não tinha um lugar para morar.
Havia um grande respeito mútuo entre os dois músicos.
“Ele é um dos maiores artistas e compositores de todos os tempos, não apenas na minha pequena cidade, mas em todo o mundo e isso sempre me deixou muito orgulhoso”, disse Jerry. “Ele nos ensinou desde cedo que você só precisa da música. Ele foi um escritor muito profundo, emocional e sinto que tenho uma afinidade com escritores como Chris".
Jerry nos disse que o disco "Rainier Fog" é uma homenagem ao mundo de onde o ALICE IN CHAINS veio e aos amigos que não estão mais conosco. Esses sentimentos de tristeza unem as 10 músicas do álbum, explorando a perda em todas as suas formas.
Nos últimos anos, parece que a nossa infância está morrendo diante de nossos olhos. Chris Cornell, David Bowie, Lemmy Kilmister, Chester Bennington, Prince e a lista parece infinita. Pela primeira vez, estamos vendo a passagem desses ícones que consideramos atemporais. Eles não são mais seres superdimensionais talentosos que podem viver para sempre - eles têm as mesmas fraquezas que nós.
“Com certeza muita coisa aconteceu e muitas perdas”, comenta o vocalista/guitarrista William DuVall, tomando chá de frutas com mel para proteger a sua voz antes do show que eles irão apresentar esta noite em New York. “Quase parece surreal, como se fosse algo demais para aceitar... Eu acho que a vida é toda sobre como você processa a perda e o que você faz com ela. Temos trabalhado nesse tema há muitos anos, mas parece que você leva uma surra na cabeça de vez em quando!"
Enquanto eles estavam gravando o novo álbum, a avó de William faleceu aos 105 anos. Descrevendo-a como um pilar em sua vida, William nunca pensou que ela iria embora um dia. Pensando na sua avó, Chris Cornell e entre outros que se foram, William escreveu e compôs a música "Never Fade", quando ficou gravando sozinho no Studio X até às 03:00hs da madrugada. Esta canção inclui uma letra poderosa, como: "Perda de controle / Todos os meus amigos estão indo embora".
Quando os membros do ALICE IN CHAINS chegam aos 50 anos de idade, é algo que eles precisam enfrentar...
“Não sei se fica mais fácil, você apenas desenvolve mais mecanismos de enfrentamento”, diz William, lentamente e cuidadosamente falando. “De certa forma, fica mais difícil, porque você também está enfrentando a sua própria mortalidade. Quando você é jovem e alguém morre, é uma coisa tão abstrata, mas quando você envelhece, pensa: 'Nossa, ok, não pensei que essa pessoa fosse embora um dia' ou 'Achei que aquela pessoa era super saudável e se isso aconteceu com ela, pode acontecer com todos'. Torna-se muito mais um confronto direto, sabe?”
Jerry é mais blasé sobre a morte, sabiamente dizendo que já passou da metade de sua jornada: “É apenas uma parte natural da vida, porque todos nós vamos chegar nisso em algum momento, é 100% garantido”, diz ele sem rodeios. “Não importa qual profissão você exerça na vida, quando chegássemos aos 50 anos de idade, alguns de nós não estariam mais aqui e isso é apenas parte da vida".
“É muito óbvio que tudo isso é temporal, é poeira em um segundo e nem sabemos por que estamos aqui”, acrescenta William. “Não sabemos o que está acontecendo... Eu simplesmente vou amar quem eu amo muito mais amanhã, porque na próxima semana a pessoa com quem eu estou rindo pode não estar mais aqui - ou até eu mesmo. Essa parte é louca, mas é o que é”.
Mas perda não significa necessariamente morte. Talvez seja a história de um relacionamento romântico que azedou e embora Jerry não vá entrar em detalhes, ele sabe que é um tópico relacionável. Aproveitando o ensejo, a canção "All I Am" investiga algo mais introspectivo - o medo de se perder.
Jerry comenta sobre esta música: “Eu tinha a imagem de um velho boxeador que já passou da idade, tipo, que passou por muitas lutas e danos, mas que ainda continua lutando. Particularmente, estou em um caminho há tanto tempo que não saberia mais o que fazer se não pudesse fazer isso, você me entende? Isso é tudo o que eu sou? Esse é o aspecto da fragilidade humana dessa afirmação, mas também é uma percepção de que sou muito mais do que isso. O boxeador já passou por muitas lutas, mas não está questionando por que fez isso ou o seu compromisso em fazê-lo. Você não está lutando pelo título, mas ainda se preocupa em fazer isso. É uma honra não desistir”.
E Jerry Cantrell não vai desistir.
Começando em 1987 com o baixista original Mike Starr e com Layne Staley - ambos não estão mais conosco - ALICE IN CHAINS não teve as viagens das mais fáceis, mas é uma história sem fim à vista.
“Não sei o que me fez querer fazer isso, mas eu sabia que estava disposto a fazer o que fosse necessário para que isso acontecesse”, finaliza Jerry Cantrell sobre a sua profissão. “E ainda faço, sabe? É uma coisa admirável, uma profissão admirável, uma jornada admirável e estou fazendo isso com os meus amigos. Estou fazendo isso exatamente pelo mesmo motivo que queria quando estava tocando violão no meu quarto quando adolescente. Eu quero fazer isso e ainda estou fazendo”.
Aproveitando, confira a resenha que o site rockinthehead havia feito sobre o disco "Rainier Fog":
Track-list:
1. The One You Know
2. Rainier Fog
3. Red Giant
4. Fly
5. Drone
6. Deaf Ears Blind Eyes
7. Maybe
8. So Far Under
9. Never Fade
10. All I Am