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by Brunelson

Bad Brains: "não se preocupe com o que as pessoas dizem sobre você ser estranho ou diferente"


O vocalista do BAD BRAINS, H.R., foi entrevistado pela revista britânica Kerrang e dentre vários assuntos, falou também sobre os primeiros dias da banda na capital Washington sendo uma inspiração para tantas outras e o futuro do grupo.

Confira alguns trechos dessa matéria e entrevista:

Em 1987, com o punk rock de joelhos, BAD BRAINS foi a Londres em turnê de divulgação do seu 3º álbum, "I Against I", lançado pela lendária SST Records em novembro de 1986. Os quatro jovens de Washington - o vocalista H.R., o guitarrista Dr. Know, o baixista Darryl Jenifer e o baterista Earl Hudson - começaram a sua jornada de 01 mês com um show no Clarendon Hotel em Londres, onde mil pessoas ficaram sem ingressos do lado de fora. Pouco menos de quatro semanas depois, a penúltima data da parte europeia da turnê viu uma apresentação no clube Electric Ballroom, também em Londres, que continua sendo um dos shows de punk rock mais excepcionais que a cidade de Londres já recebeu.

Por que? Porque por um tempo, BAD BRAINS foi de longe a banda punk mais inovadora e eletrizante que o mundo já conhecia. Ao longo de dois lançamentos - "Bad Brains" (1º disco, 1982) e "Rock For Light" (2º disco, 1983) - o quarteto reinventou uma cena decadente, tocando mais rápido e melhor do que o resto das outras bandas, e fazendo isso com o tipo de energia que alimenta as megacidades.


Influentes e incendiárias, canções como "Banned in DC", "I", "At The Movies" e "Destroy Babylon", são tão boas quanto qualquer outra do cânone punk.

Tamanha era a sua influência e reputação que o mundo deveria ser deles para ser conquistado, mas o BAD BRAINS nunca conseguiu se manter unido regularmente e muitos até culpam esse fator como uma barreira para o quê além mais o BAD BRAINS poderia ter se tornado.


Hoje, H.R. - que significa "Human Rights" - ainda segue em frente, embora não com o BAD BRAINS.


Atualmente ele canta sob o título de H.R. com muito mais ênfase no reggae do que no punk rock. A selvageria indomada da juventude pode ter dado lugar a uma meia-idade muito mais tranquila, mas a jornada até esse ponto reflexivo e pacífico foi longa, estranha e cheia de acontecimentos.


Jornalista: Conte-nos sobre os seus primeiros dias de infância, por favor.

HR: Bom, eu me mudava muito porque o meu pai estava na Força Aérea. Fui para a minha primeira escola na Jamaica, mas também moramos no Havaí onde comecei a escola primária. Estávamos realmente em todo o lugar.


Jornalista: Mas você nasceu em Liverpool, certo?

HR: Sim. O meu pai conheceu a minha mãe em Londres e ele estava fazendo algumas viagens pela Europa, então, ele a levou para Liverpool, onde eu nasci. Todos nós moramos em Liverpool por cerca de 02 anos, mas infelizmente não tenho nenhuma lembrança da grande cidade que deu ao mundo os BEATLES.


Jornalista: Como você se sentia em relação a "pular" de cidade em cidade quando criança?

HR: A minha mãe veio de Kingston, Jamaica, mas ela também já tinha viajado bastante e o meu pai viajava muito por causa do seu trabalho, então, essa era apenas a minha vida. Quando criança, fui para cerca de 12 ou 13 escolas em lugares tão distantes como Texas, Alabama, Geórgia, Califórnia, New York, capital Washington, Havaí e em todos os lugares. O máximo de tempo que passei em um lugar foi cerca de 04 anos em Maryland.


Jornalista: Todas aquelas viagens tornavam difícil fazer amigos e sentir-se enraizado em algum lugar?

HR: Sim senhor, foi muito difícil. Eu faria novos amigos e logo teria que deixá-los, e em seguida, fazer todo outro grupo de novos amigos. Claro, eu não queria deixar os meus velhos amigos para trás e isso continuou durante o ensino fundamental, o ensino médio e depois o próprio ensino superior... Foi difícil.


Jornalista: Uma das cidades com as quais você está mais associado é a capital Washington. Como você foi parar aí?

HR: Eu estava morando em Staten Island e depois no Queens em New York. Eu estava na equipe de natação e meu treinador queria me levar para as Olimpíadas em Montreal no ano de 1976 e implorava à minha mãe: "Por favor, deixe-me levá-lo às Olimpíadas" e ela disse: "Não, vamos ter que nos mudar de cidade". Então, nós fomos para o sudeste de Maryland e fui estudar na escola local.


Jornalista: Se você tivesse ido às Olimpíadas em vez de perseguir interesses musicais, como você imagina que a sua vida teria mudado?

HR: Tenho certeza de que teria ganhado uma medalha de ouro. Eu acho que provavelmente o que teria acontecido era que eu teria aparecido na TV e feito um monte de, como você diz, coisas interesses pra mim... Eu teria me saído bem comercialmente, vamos colocar dessa forma, mas nós fomos para Montreal como o BAD BRAINS nos anos 80 e depois voltamos nos anos 90.


Jornalista: Conte-nos sobre como era se apresentar com o BAD BRAINS nos primeiros dias?

HR: Earl e Darryl cursaram o 1º grau juntos quando eu estava no 2º grau, porque eu era um pouco mais velho. Nós 03 tocávamos de vez em quando, mas Darryl sempre estava em uma banda e uma vez eles lançaram uma música chamada "The Booty". Um dia eu estava dirigindo o meu carro e vi Darryl andando na rua, então, encostei o carro e perguntei se ele precisava de uma carona, e ele me disse: "Sim, claro, cara". Começamos a conversar e dissemos: "Ok, vamos começar uma banda juntos". Darryl era o mais novo de nós, sabe? Um amigo nosso nos perguntou se já tínhamos ouvido algum som punk rock antes e nós dissemos: "O que você quer dizer com punk rock?" Porque gostávamos de bandas de jazz progressivo e coisas assim. Então, um dia esse cara nos convidou para ir à sua casa onde ouvimos todos esses discos de bandas como DEAD BOYS, SEX PISTOLS, RAMONES e todos esses grupos de punk rock. Começamos a ouvir os singles, mas por engano tocamos o vinil a 78 rpm e eles estavam rápidos demais! Dias depois, arrumamos uma casa na área da capital, onde fazíamos festas no quintal e no porão, e foi quando tudo começou para nós. Foi quando decidimos que seríamos uma banda de punk rock, porque tínhamos gostado do que tínhamos ouvido naquela velocidade, mas achei que a letra poderia ser um pouco mais positiva. É por isso que o BAD BRAINS era um pouco mais positivo do que os outros grupos de punk rock. E a propósito, mudamos o nosso nome para BAD BRAINS, originalmente éramos chamados de THUNDERBIRDS.



Jornalista: Onde foi o 1º show do BAD BRAINS?

HR: Na verdade, fizemos o nosso 1º show em New York, no lendário e agora fechado clube punk, CBGB. Todas as segundas-feiras eles tinham uma noite alternativa para as bandas novas e perguntamos se não havia problema em fazer um show, e eles nos disseram: "Claro, cara, vocês podem tocar". As pessoas esperavam que fôssemos uma banda branca, mas todos somos negros. As pessoas ficavam, tipo: "Nossa, espere 01 minuto, o que está acontecendo?" No início foi meio difícil para nós conseguirmos shows em outro lugar, mas no clube CBGB estávamos bem e decidimos sair em turnê por diferentes lugares pela Califórnia e assim por diante, e desde o início as crianças gostavam muito do que estávamos fazendo. Foram todos esses adolescentes que realmente nos apoiaram e soubemos que a nossa música estava chegando às paradas na Europa, então, decidimos sair em turnê por lá também. Havia um grupo inglês chamado THE DAMNED que foi o primeiro a dizer que gostaria de nos convidar para sair com eles pela Europa, então, tentamos pegar um avião - éramos garotos, não sabíamos o que estava acontecendo - e quando pediram os nossos passaportes no aeroporto, claro que não tínhamos nenhum! Então, tivemos que voltar pra casa.


Jornalista: Tudo parecia bastante caótico...

HR: Bom, depois de um tempo conhecemos um cara chamado Mo Sussman, que nos disse que queria ser o nosso empresário. Ele decidiu nos levar a uma loja de música e comprou equipamentos e instrumentos novos para todos nós, bem como uma van nova. Tivemos que mudar de casa porque as pessoas reclamaram do barulho que fazíamos nos ensaios, então, nos mudamos para um bosque e tocávamos lá em um nível rápido e intenso enquanto tornávamos a música a mais complexa e precisa possível. Tentamos adicionar técnicas de jazz ao punk rock, tipo, tínhamos ouvido falar sobre a banda punk THE DICKIES de Los Angeles e o que eles estavam fazendo, então, tentamos incorporar um pouco do som deles também... Fomos em frente e tentamos fazer esse tipo de som e tudo deu certo.


Jornalista: Em 1982, BAD BRAINS lançou o álbum homônimo de estreia e que agora é considerado um clássico do punk rock. Como foi gravar esse disco?

HR: Um cara chamado Neil Cooper tinha ouvido falar do grupo e veio até nós e disse: "Vocês todos estariam interessados em lançar uma fita cassete?" Dissemos a ele que gostaríamos, mas não realmente saberíamos como iria chamá-la. Então, decidimos pelo nome "Bad Brains" e quando as crianças fossem escutar, elas entenderiam rápido e claro que nós gostamos do nome. Neil Cooper veio ver o grupo para ver se éramos tão bons quanto as pessoas diziam que éramos e ele descobriu que realmente éramos. Foi assim que tudo começou.


Jornalista: Em 1983, vocês gravaram o 2º álbum, "Rock For Light", com o vocalista/guitarrista da banda THE CARS, Ric Ocasek, supervisionando a produção. Como foi trabalhar com alguém assim de outro gênero musical?

HR: De alguma forma, ele tinha ouvido falar de nós no Arizona. No começo, ele meio que nos pegou desprevenidos, porque ele era um cara alto e branco de uma banda pop rock querendo nos produzir, mas ele e Darryl se reuniram, conversaram e ele o convenceu de que realmente queria trabalhar conosco. Foi realmente interessante e empolgante trabalhar com alguém assim, alguém de fora da cena punk. Ele nos levou a um estúdio e apenas disse: "Vá em frente e toquem o que vocês quiserem", e podíamos tocar qualquer tipo de som! Dissemos a ele: "Liberdade, liberdade, somos livres!" e foi assim que tudo começou com ele.


Jornalista: Você acha que é justo quando as pessoas dizem que o BAD BRAINS foi uma banda revolucionária?

HR: Sim, acho justo.


Jornalista: Havia muito racismo na cena punk quando você surgiu?

HR: Na medida em que, quando fazíamos os shows para as pessoas, era como: "Espere, o que está acontecendo aqui?" O fato de não sermos brancos pegou as pessoas desprevenidas, mas elas não se importavam que nós éramos negros, porque gostavam muito da nossa música. Todas as bandas que vieram antes de nós e que tocavam punk rock eram brancas, então, éramos diferentes, com certeza.


Jornalista: Como foram aqueles primeiros shows?

HR: Bom, nós escrevemos a música "Banned in DC" depois de tocarmos em algum lugar na capital Washington onde as crianças enlouqueceram no show. Quando começamos a tocar, elas piraram, tipo, algumas coisas foram quebradas e houve muita bagunça. O dono do clube nos disse: "Vocês não podem mais tocar aqui!" e isso inspirou esta música, mas depois de um tempo, ele nos chamou e disse: "Na verdade, vocês são bons e se quiserem, podem voltar e tocar aqui".


Jornalista: Você foi uma influência enorme para o jovem Ian MacKaye, do MINOR THREAT (vocalista) e depois do FUGAZI (vocalista/guitarrista), que também morava na capital Washington. Quais são as suas lembranças dele?

HR: Ele aparecia para ver os nossos shows quando ainda estava em sua 1ª banda, TEEN IDLES, mas eles eram o nosso oposto. Nós íamos para um lado e eles estavam indo para outro. Tocávamos reggae assim como punk rock e líamos a bíblia, mas o TEEN IDLES gostava de beber Coca-Cola. Depois, eles mudaram o nome para MINOR THREAT e abriram a sua própria gravadora, Dischord Records. Depois disso, veio o FUGAZI e eles realmente tinham os seus próprios negócios. Eles cobravam das pessoas apenas U$ 4 dólares para vê-los nos shows, o que foi legal, mas eles também estavam tão empolgados com o que nós estávamos fazendo, o que foi ótimo.



Jornalista: Vocês também eram deuses para o BEASTIE BOYS. Para o início de carreira deles como banda punk hardcore, BEASTIE BOYS possui uma grande dívida de influência com o BAD BRAINS.

HR: BEASTIE BOYS era tão selvagem e imprevisível... Um dia, eles vieram até nós e disseram que éramos uma banda crucial para eles e que eles queriam nos produzir. O resultado foi o álbum "Build a Nation" (8º disco, 2007). Era o Sr. Adam Yauch (vocalista/baixista) e que ainda estava vivo na época. Eu nunca tinha conhecido ele pessoalmente desse jeito e não tinha ideia de como ele era, mas Yauch apareceu e produziu o nosso álbum. Em 1989, saímos em turnê com o BEASTIE BOYS por um tempo e eles estavam agindo como loucos... Uma noite, vi um membro da plateia apontar uma arma para uma garota ao lado e falei: "Não, não, você não pode fazer isso!", e eu o atingi na cabeça com o microfone. Isso provou ser um pouco selvagem para algumas pessoas, então, eu tive alguns problemas por causa disso.


Jornalista: No álbum, "I Against I" (3º disco, 1986), você cantou uma música na prisão, "Sacred Love". Sobre o que era tudo aquilo?

HR: Nós com certeza fizemos isso. Essa foi a ideia do produtor desse álbum, Ron Saint Germain. Tínhamos gravado a música para a gravação do disco, "I Against I", mas eu e Earl fomos presos por uma acusação de tráfico de maconha aqui na capital, então, Ron nos disse: "Tudo bem, cara, vamos tentar gravar o vocal por telefone!" Então, eu tive que informá-lo a que horas poderia usar o telefone e ele o conectou às máquinas do estúdio. Quando liguei para eles, eles tocaram a gravação máster da música pra mim pela primeira vez - eu nunca tinha escutado antes - e quase não pude ouvir nada, cara. Eu pensei: "Bom, deixe-me ir em frente e cantar essa música o melhor que posso", e eu tentei muito bem, cara. Eu cantei os vocais com um groove melódico e calmo, mas também com um tom duro. Quando eu terminei, eles disseram: "Sim, cara, conseguimos! Gravamos os seus vocais e eles ficaram perfeitos!" Tudo somente na primeira tentativa.


"Sacred Love"


Jornalista: Você acha que vai tocar com o BAD BRAINS novamente?

HR: Bom, eu vou te dizer uma coisa, nós já terminamos cerca de 03 ou 04 vezes ao longo da carreira e nós conversamos sobre isso. Earl acha que estamos ficando velhos demais para tocar... Ele quer fazer filmes, cara, então, ele está em Atlanta agora tentando fazer isso acontecer. Há uma versão diferente do BAD BRAINS com Darryl no baixo, Dr. Know na guitarra e eles estão tocando com um cantor de jazz, mas decidiram se chamar de DEFIANT ONES. Eles foram em frente e tentaram, mas não sei o que está acontecendo agora. Darryl chegou a me perguntar: "O que devo fazer, H.R.? Devo continuar tocando rock'n'roll ou devo tocar reggae?" E eu lhe disse: "Olha, você é um dos caras mais malvados que existe. Você é excelente e continue tocando rock'n'roll, cara", mas ele decidiu ser pintor e artista plástico.


Jornalista: O que o futuro reserva para você?

HR: Ah, cara, de mim, você pode esperar ouvir algumas das músicas mais doces de reggae que já ouviu na vida. Reuni uma nova banda chamada HUMAN RIGHTS com os meninos com quem estou trabalhando agora e esse grupo é fantástico. Eu quero dizer algo às pessoas: Não desista. Continue ouvindo a minha música e não se preocupe com o que as pessoas podem dizer sobre você ser estranho ou diferente dos outros, ou que foi hipnotizado pelo reggae... Nada disso é verdade. O que fazemos é verdadeiro para a essência do reggae em seu coração e você pode sentir isso. Fazemos boa música, música verdadeira e mal posso esperar que as pessoas ouçam nos shows.



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