Jane's Addiction: "eu ainda uso psicodélicos", disse o baixista
Confira matéria e entrevista que a revista Spin realizou recentemente com o baixista e membro fundador do JANE'S ADDICTION, Eric Avery.
Antes e somente para ilustrar, Avery ficou na banda em seu período clássico de 1985 à 1991, onde gravou o baixo nos 02 primeiros álbuns de estúdio do JANE'S ADDICTION e no seu 1º trabalho lançado, que foi um disco ao vivo homônimo de 1987.
O grupo tinha encerrado as atividades em 1991, retornando em 1997 com os membros originais, menos com a presença de Avery. O baixista só iria retornar à banda em 2008, mas logo em 2010 ele sairia, sem o grupo ter gravado 01 música sequer com a formação original.
Em 2022, com uma grande ajuda e solicitação de Taylor Hawkins (falecido baterista do FOO FIGHTERS) - que era fã do JANE'S ADDICTION e amigo de todos da formação original - Avery retorna para o que seria o momento definitivo e duradouro na história do JANE'S ADDICTION, onde o grupo saiu em turnê mundial visitando os 04 cantos do mundo (algumas turnês em parceria com o SMASHING PUMPKINS) e gravando e lançando músicas inéditas, mas em uma sexta-feira 13 de setembro de 2024, durante um show em Boston, as suas desavenças continuavam e o mesmo foi interrompido com ameaças de agressão entre os próprios membros da banda.
Essa perna da turnê americana foi cancelada e este foi, por enquanto, o último show do JANE'S ADDICTION. O final ainda não é feliz, mas aguardamos por uma atualização oficial do grupo sobre o futuro da banda.
Segue a matéria e entrevista completa (realizada semanas antes da briga no palco):
O co-fundador do JANE'S ADDICTION e "maestro" do baixo, Eric Avery, sobre a ascensão, a correria, a ruína e a ressurreição de sua volátil banda: "Encontrando o fluxo de energia mágico de um som para outro, construindo uma banda e encontrando maneiras de um murmúrio espiralado para um grito cardíaco, de uma curva de humor melódica no baixo para uma megatonelagem de guitarra e percussão".
Essa entrevista foi realizada pelo jornalista Matt Thompson no terraço de um prédio em um dia ensolarado. E todas as falas são do baixista do JANE'S ADDICTION.
"Uma vez, saímos de Los Angeles como uma banda em meados dos anos 80 em uma Van, e na estrada eu estava com uma seringa carregada de heroína com seu êmbolo preso contra a parede interna da Van, enquanto tentava manter a agulha na minha veia. Enquanto saíamos naquela noite, eu me lembro de sentir que era o começo de algo grande, mas eu não tinha ideia de que eram as primeiras viagens em uma estrada que serpentearia tudo dentro e fora de nós, todas as corridas e curvas que eventualmente me colocariam aqui lhe falando como é estar no JANE'S ADDICTION como um homem de 58 anos de idade... Eu ainda estou aqui".
"Naquela noite, tudo o que eu sabia era que minha vida musical estava ficando muito maior. Até aquele momento, nossos shows só aconteciam dentro de uma certa região geográfica. Nós ensaiávamos em um beco na cidade de Santa Monica, California, que era uma loja de roupas punk, onde hoje é o depósito de sapatos da NaNa (o mesmo local do meu último emprego de verdade antes do JANE'S ADDICTION). Fazíamos shows no clube The Scream, que ficava em um porão de um hotel no centro da cidade, e também nos apresentávamos no clube The Roxy em Hollywood. A fronteira mais remota no mapa do JANE'S ADDICTION pode ter sido o clube Safari Sam's em Orange County, California".
"No entanto, mergulhar deliberadamente no espaço e no além, realmente começou pra mim quando eu tinha uns 12 anos de idade se aventurando nas drogas — ácido LSD e cogumelos. Sempre fui um pouco insatisfeito com o mundo como ele é e procurei outras rotas através dele. Inicialmente eram livros. Livros foram minha primeira droga, mas o LSD me deu uma sensação tangível de aventura".
"Meus pais não sabiam, mas o LSD era meu próprio caminho. Eu era muito tímido, uma criança introvertida e era epiléptico — convulsões desde bebê — o que faz você se sentir como se não fosse como as outras pessoas. Você tem uma experiência tão visceral de algo dramático acontecendo com você que nenhuma outra pessoa na sua escola passa pela mesma coisa. Aconteceu com frequência suficiente para ser público e as outras crianças zombavam de mim. Mais tarde, eu gostava de surfar sozinho, então, estava sempre no fundo da minha mente: 'O que vai acontecer se eu tiver um ataque epiléptico aqui?' Isso acabava comigo, sabe? Ou se eu estivesse no alto de uma montanha, isso me deixou sentindo constantemente vulnerável fisicamente".
"Então, eu não me encaixava, mas agora com o ácido LSD eu e meus amigos estávamos indo para um lugar que nem todo mundo vai, e é um lugar especial. Era isso que o LSD era. E certamente expandia os horizontes de alguém, tornando-o consciente do poder da mente e do que era possível".
"Eu tinha um amigo que morava em Los Angeles do outro lado da rua do campus da UCLA (universidade). Nós tomávamos LSD e vagávamos pela universidade à noite. Era basicamente uma área de livre circulação, com um jardim botânico e nós íamos vagando com pedaços de giz na mão, desenhando no chão e conversando. Era meio filosófico, apenas divagando sob efeito de LSD e contemplando ser um ser humano. Eu ainda faço isso".
"Ele era meu melhor amigo na escola primária, Chris Brinkman, que seria o guitarrista do futuro JANE'S ADDICTION em uma das primeiras iterações da banda, tendo tocado guitarra pela 1ª vez na minha banda do ensino médio da escola. Desde os 12 anos de idade, eu costumava ficar na casa de Chris, onde ele morava com sua mãe, Jeanne Crain, uma estrela de cinema dos anos 50. Na capa da revista Life, há uma foto incrível dela em um banho de espuma com uma bolha na ponta do dedo".
"Eles moravam em uma mansão com uma entrada circular e pilares na frente quando você ia se aproximando. Quando você entrava pela porta da frente, o lugar era acarpetado com um tapete vermelho brilhante e de pelos soltos, e havia uma escada curvada que subia para uma sacada que tinha dentro da casa. No caminho para cima das escadas, havia retratos de Jeanne quando jovem. Ela era loucamente linda quando jovem..."
"Eu não batia na porta da frente quando ia na casa dele. Eu subia em uma pequena árvore ao lado e entrava por uma janela da sala que sempre ficava aberta, e então, subia as escadas. No caminho para o quarto de Chris, eu passava pelo quarto de Jeanne. A porta estava aberta e eu espiava. Ela estava sempre em sua cama grande e ornamentada assistindo TV a cabo. Ela também ficava sentada no sofá no andar térreo, debaixo de cobertas tomando pílulas, bebendo e assistindo TV".
"Ela era uma drogada, alcoólatra, uma pessoa que tomava pílulas, mas de vez em quando, como no Natal ou algo assim, ela aparecia. Ela descia e sentava na cabeceira da mesa e era a mulher mais carismática e incrível que você conhecia. Então, no outro dia ela desaparecia e eu não a via por 06 meses, exceto naqueles meus olhares para o quarto dela aqui e ali. Ela era uma deusa pra mim".
"Eu comparo Jeanne à Srta. Havisham em Great Expectations ou a atriz Gloria Swanson em Sunset Boulevard. A mansão estava em ruínas, a piscina toda coberta de algas e embora a propriedade não estivesse totalmente uma bagunça, parecia meio abandonada, exceto por Jeanne e Chris morando em seus quartos no andar de cima da casa, além dos fundos da mansão, onde Chris desenhava nas paredes e podia fazer o que quisesse. Era um ambiente meio incrível, meio gótico americano e cinematográfico".
"O pai de Chris, Paul Brinkman, que a Warner Bros. havia contratado como dublê do ator Errol Flynn, aparecia de vez em quando, mas ele geralmente morava em seu rancho que ficava na cidade de Santa Barbara, California. E Chris era incrível, bonito, misterioso e talentoso. Ele sabia tocar violão e quando ele escreveu um poema, o pessoal da escola publicou no boletim informativo. Chris era simplesmente brilhante, carismático e louco. Eu estava meio que 'apaixonado' por ele".
"Depois de alguns anos usando drogas, Chris e eu estávamos fazendo de tudo e tentando de tudo. A primeira coisa que injetamos algo, já quando tínhamos 17 ou 18 anos de idade, foi speed (anfetaminas). Era definitivamente pela coisa física, sabe? Sentir aquela adrenalina, mas também eu me pegava pensando quando estava chapado: 'Nesse momento estou na porra do país dos chapados e estou brincando com a morte'. Mexia muito com as minhas emoções".
"Mas houve mais quedas e queimadas durante os 03 meses em que eu e Chris estávamos gravando músicas usando bastante speed, porque a gente criava uma música e conseguia aquela adrenalina incrível no corpo, literalmente quase orgástica, e eu pensava: 'Agora estou apenas usando speed e eu quero essa adrenalina de novo'. Então, você usa mais speed, criava outra canção e sentia aquela adrenalina no corpo, mas depois de um tempo, você percebe que está usando uma tonelada de speed e o negócio já está ficando horrível pra caralho. Mas então, você começa a pensar: 'Eu quero mais é que minha cabeça exploda mesmo', então, você continua usando mais. Durante esse tempo, as pessoas que viviam ao nosso redor estavam indo para o hospital passando mal, tendo colapsos nervosos e todo aquele drama".
"Então, veio a heroína. A heroína tinha uma mística sobre ela e quando eu usei pela 1ª vez, fiquei realmente animado e emocionado com a ideia de ter usado, mas qual a sensação real de estar usando? Eu vomitei. Naquela 1ª vez, eu não achei que eu fosse ficar viciado em heroína, porque eu realmente gostava mais da empolgação (o ato) em usar heroína, mas não gostava da sensação que ela dava".
"Obviamente eu superei isso, mas daí aconteceu que eu não queria fazer mais nada na vida. Eu fugi de casa e quando voltei uma noite, havia um intervencionista na casa que me convenceu de que minha vida estava uma merda. Então, fui para a clínica de reabilitação, onde conheci Carla Bozulich — mais tarde da banda punk rock, GERALDINE FIBBERS — que se tornou minha namorada intermitente durante nossa juventude".
"Ela conhecia Perry Farrell (vocalista do JANE'S ADDICTION) e quando estávamos conversando uma tarde ao telefone, ela perguntou se eu conhecia a banda dele na época, PSI COM. Eu disse que sim e que eles eram uma porcaria, realmente copiando o rock inglês. E ela me respondeu: 'Ah, ok então', e começou a falar sobre outra coisa. Mais tarde naquela conversa, eu perguntei pra ela: 'Espere, por que você perguntou sobre a PSI COM?' Foi quando ela me respondeu: 'Porque eles estão procurando um baixista'. E eu disse: 'Ah, na verdade eles não são tão ruins assim'”.
"Minha habilidade de tocar baixo estava meio que acabada naquela época. Eu não estava mais na banda do colégio com Chris e não estava mais tocando. Eu ia vender meu baixo, amplificador e fazer outra coisa na minha vida, mas quando Carla disse isto, eu vi a oportunidade surgir novamente. Eles da banda conheciam todas as pessoas legais em Hollywood e mais tarde resolvi fazer um teste e foi assim que conheci Perry Farrell".
"No dia em que fiz o teste, o guitarrista não estava lá, então, toquei somente com Perry e o baterista, só nós três. Estávamos fazendo coisas como: 'Eu tenho um riff aqui', 'Aqui está uma progressão de acordes' , 'Aqui está uma linha de baixo'. E foi assim que criamos a música 'Mountain Song'. Aconteceu naquele mesmo dia e foi totalmente espontâneo. Era eu dizendo pra eles no começo através da minha boca e mostrando no baixo ao mesmo tempo: 'As notas são essas daqui: da da da da da da da da, duh duh duh duh duh e ba ba ba ba".
"Se eu não tivesse dado importância quando Carla me perguntou se conhecia a banda de Perry, o quanto do mundo seria diferente para mim e da cultura? Não haveria o Lollapalooza Festival, por exemplo. Quando nos conhecemos, Perry era um acomodador (pessoa que, em teatros e cinemas, indica o lugar de cada espectador e mantém a ordem na sala) do Survival Research Laboratories (grupo de arte performática pioneiro em performance com máquinas de grande escala). Eles faziam apresentações no leito de cimento do Rio Los Angeles com máquinas caseiras destruindo umas às outras. Assinei um termo de responsabilidade dizendo que eles não são responsáveis por ferimentos no público se algo der errado, então, eu ficava bem ao lado de todas essas máquinas atirando umas nas outras e cortando umas às outras. Eles até tinham catapultas. Foi incrível pra caralho e eu era um grande fã".
"Eu também fazia parte de um movimento em que as pessoas falavam sobre rituais tribais primitivos e o poder que eles podem ter na sociedade contemporânea. Fui apresentado a eles por Perry, que era amigo na época de um antropólogo da UCLA que tentou, sem sucesso, fazer uma escarificação na cabeça. Esse antropólogo fez pequenas incisões e esfregou sal nas feridas para que elas ficassem irritadas por mais tempo e ficasse uma cicatriz depois de curadas. Ele fez isso e passou por toda a dor, tipo, doeu pra caralho, mas acabou curando as feridas do mesmo jeito e depois de um tempo você não conseguia ver nada de marcas na cabeça dele".
"Perry era o cara mais interessante, incomum e carismático que eu já conheci na vida, e ele se tornou uma espécie de meu irmão mais velho. Ele me apresentou ao movimento primitivo moderno da época e Perry descobriu que você poderia obter uma bolsa de artes de US$ 10 mil dólares de um lugar no centro de Los Angeles. Então, fomos lá e eu bati sob efeitos químicos em um tambor, enquanto Perry fazia os seus barulhos. Não conseguimos a bolsa, mas isso se tornaria uma música do JANE'S ADDICTION chamada 'Chip Away'. Em nossa banda no início e com raras exceções, qualquer ideia que você tivesse e acabava mostrando, se tornava em uma coisa, porque os blocos de construção sonoros eram básicos. Você estava apenas tentando descobrir uma maneira de dar sentido musicalmente a algo. Você não estava escrevendo canções como Paul McCartney ou John Lennon. Em vez disso, era assim: 'Aqui está um barulho. Qual é o próximo barulho? Que som faz sentido com este som aqui'".
"Chip Away" (Disco ao vivo, "Jane's Addiction", 1987)
"Um amigo me disse recentemente que ouviu algumas gravações demo antigas do JANE'S ADDICTION, de antes do guitarrista Dave Navarro, e ficou surpreso com o quanto aquelas canções já soavam como o JANE'S ADDICTION, o mesmo grupo que nos tornamos mais tarde em pleno percurso de voo. E o nosso baterista, Stephen Perkins, me disse recentemente que ele ainda possui todas as fitas cassete daquela época e que ele gosta mais das versões demo que ficaram gravadas do que as versões oficiais que foram lançadas nos álbuns de estúdio que acabaríamos fazendo".
"No começo de tudo, o meu amigo Chris é que era o nosso guitarrista, tocando no 1º show que fizemos no clube The Roxy, mas ele estava sempre insatisfeito na banda. Chris queria estar em uma banda que fosse mais como o SAVAGE REPUBLIC o estilo das músicas ou de algum outro grupo local que tínhamos visto. Eu lembro que Chris saiu da banda, mas acho que Perry se lembra de que fomos nós que pedimos para ele sair do grupo. De qualquer forma, eu sei que Chris não estava satisfeito fazendo parte da banda".
"Conforme as coisas começaram a decolar com o JANE'S ADDICTION, eu comecei a passar menos tempo com Chris e com a maioria dos meus amigos, mas anos depois, quando eu não estava no JANE'S ADDICTION e tinha montado minha própria banda, POLAR BEAR, eu me reconectei com Chris e pedi para ele vir tocar no POLAR BEAR. Chris veio aos ensaios, mas ele me disse: 'Pois é, eu simplesmente não curto muito esse tipo de música. Eu quero fazer coisas como o SMASHING PUMPKINS'”.
"Eu disse a ele: 'Na verdade, você simplesmente não quer estar em uma banda comigo. Se eu estivesse em uma banda como o SMASHING PUMPKINS, você iria me dizer que iria querer fazer algo mais interessante. E depois, quando eu estivesse fazendo algo mais interessante, você iria me dizer que gostaria de estar no SMASHING PUMPKINS'... Chris iria morrer de overdose de heroína em 1997 e ele tinha 31 anos de idade".
"Quanto aos anos em que o JANE'S ADDICTION realmente estourou e ganhou força na década de 80, eu realmente não tenho uma memória tangível sobre essa época. Eu estava muito chapado das drogas ou muito preocupado com as coisas, sobre meu lugar no mundo, sobre o que estava acontecendo com a banda e sobre o relacionamento entre Perry e eu. Sempre havia algo para me preocupar. No começo, quando trouxemos Dave Navarro e Stephen Perkins, eles trouxeram junto esse som de rock regular e pra mim soava muito com o LED ZEPPELIN, que era diferente do som que eu escutava, sabe?"
"Eu sempre fui autocrítico e está no meu caráter. E quando eu ainda estava ficando chapado, as drogas deixavam o meu trabalho mais pesado ainda. Inevitavelmente, em algum momento de uma turnê você ficava doente por causa das drogas. Quando você saía de Los Angeles para fazer as turnês, eu ficava pensando: 'Como eu vou fazer pra me virar sem levar as drogas comigo?' Tipo, o jeito era conseguir uma grande quantia ou oferecer algo para alguém para que essa pessoa providencie as coisas para você, ou que talvez ela possa conhecer alguém que forneça drogas. Um dos truques nos EUA quando você é um drogado e sai em turnê, era ir a clínicas médicas da cidade em que passava para conseguir metadona. Era se apresentar ao médico e perguntar: 'Oi, você quer ser meu amigo?'"
"Não havia internet, então, quando você viajava internacionalmente você não tinha ideia de onde começar e para onde ir para achar drogas... É quando os fãs se tornam úteis. Você está realmente procurando por fãs para se conectar e mais ainda por causa da nossa reputação, onde havia um contingente de viciados em Londres no começo que cuidaram de mim e de Dave, ou seja, tínhamos um porto no meio da tempestade. Mas inevitavelmente, as drogas te quebram e em algum momento você fica doente. Comparado aos meus amigos drogados que moravam em Los Angeles e ficavam em casa, eu passei muito mais tempo doente por causa das drogas do que eles, porque eles tinham acessos todos os dias com recursos previsíveis e liberdade para onde ir em território nacional".
"Turnês são exaustivas, fisicamente e emocionalmente falando. E quando você está muito doente no topo ruim de sua saúde, você chega a pensar a querer pular de uma janela de um hotel, mas você vai para o show, toca e se recupera... Você fica nesse ciclo até voltar pra casa e parte do nosso apelo era que a banda não iria durar. Alguém vai morrer a qualquer hora e iremos nos separar. Isso não vai durar. Toda vez que fazíamos um show era um caos e cada apresentação nossa parecia o último show".
"O consumo de drogas pesadas no JANE'S ADDICTION era infame, mas eu consegui parar. As pessoas geralmente se surpreendem com isso, mas a última vez que usei heroína foi em 19 de agosto de 1989, então, naveguei por todo o sucesso em larga escala do JANE'S ADDICTION sem uma droga no meu sistema sanguíneo".
"Gravamos o 2º disco do JANE'S ADDICTION, 'Ritual de lo Habitual' (1990), pela Warner Brothers e passei toda aquela 1ª turnê do Lollapalooza limpo de toda droga e álcool. Nos últimos 02 anos antes do JANE'S ADDICTION acabar em 1991, vivi algumas das experiências mais potentes e possíveis em uma vida musical sóbria, presente e disponível. Ainda projetado para aventura e exploração, o meu eu limpo agora se concentrava de forma diferente nos momentos intensos da vida, querendo extrair o máximo que pudesse desses momentos em vez de cambalear por eles em um estado de estupor".
"Esse novo pico foi construtivo em vez de destrutivo, vivenciado em tempo real e com os dois olhos bem abertos. Estar completamente presente e observador nos grandes momentos da vida — aqueles momentos que facilmente passam batido quando estamos com a mente nublada e chapada — é vivenciar a enormidade da vida destilada em suas maravilhas".
"Sabe, um ponto marcante na minha carreira foi o show do JANE'S ADDICTION em 1991 no Madison Square Garden, New York. Como um adolescente maconheiro nas antigas, eu ia repetidamente às exibições de meia-noite daquele filme do LED ZEPPELIN, 'The Song Remains The Same', em um cinema local em Los Angeles. As filmagens ao vivo da apresentação do LED ZEPPELIN começam na escuridão de um palco sem iluminação. Enquanto a multidão ruge, uma legenda no telão diz: 'Madison Square Garden, New York'. Agora, em uma noite de abril e 01 década depois de todas as minhas noites naquele cinema, onde absorvi aquele pico vulcânico de rock vendo esse filme do LED ZEPPELIN, o Madison Square Garden pertencia agora ao JANE'S ADDICTION. Eu tinha 25 anos de idade e iria fazer 26 no dia seguinte, e estava completamente sóbrio naquele show".
"As luzes do Madison Square Garden se apagaram e aquele enorme local estava tudo escuro. O rugido de 18 mil fãs irrompeu o ar e me lembrei daquelas poucas pessoas que apareciam em nossos primeiros shows em clubes noturnos como o Raji's em Hollywood. Agora, o barulho da multidão rasgava o espaço e o tempo, entrei no rugido, caminhei até a frente daquele palco escuro e fiquei singular e imóvel em meio a um frenesi incipiente, cara".
"Na maioria das noites, eu iniciava a 1ª música dos nossos shows. Muitas músicas do JANE'S ADDICTION começam com o baixo e nós frequentemente e ritualisticamente, abríamos as noites com uma música instrumental de mudança de dimensão chamada 'Up The Beach'. De pé na beirada do palco, com o baixo pendurado no corpo e pronto para tocar, eu me abri internamente para aquele enorme rugido da multidão. Escutei, pensei, prestei atenção e vi que aquilo estava realmente acontecendo. Bem aqui. Agora mesmo. Só depois que eu realmente respirei aquilo tudo é que toquei a primeira nota musical".
"Up The Beach" (1º disco, "Nothing's Shocking", 1988)
"E quer saber de uma coisa? Sob efeito de heroína ou bêbado, eu nunca tinha vivenciado tais momentos assim antes na minha vida. Mas estar sóbrio no JANE'S ADDICTION naquela época era uma coisa tensa, cara, porque eu era o único da banda que não estava drogado e agora Perry me odiava e toda sua comitiva de turnê também me odiava. Tipo, quando eu entrava na van, eu ia para a última fileira e só depois que Perry e sua comitiva entravam. Era muito desconfortável, sabe? Da nossa gênese punk, de mim e Perry criando músicas juntos, chapados e encontrando o fluxo de energia mágico de um som para outro, construindo uma banda e encontrando maneiras de um murmúrio espiralado para um grito cardíaco, de uma curva de humor melódica no baixo para uma megatonelagem de guitarra e percussão, nós desconstruímos e construímos todos juntos, como um coletivo. Mas agora, o JANE'S ADDICTION tinha se tornado essa coisa pela qual não tinha mais muita sensibilidade. Não estávamos escrevendo novas músicas e não estávamos fazendo mais nada. Eu estava apenas fazendo shows e depois voltando para o meu quarto de hotel vivendo minha própria vida, e a banda é algo que está lá e que não parece mais a minha banda".
"Uma vez, fui reconhecido em uma livraria e um cara estava me perguntando sobre o nosso novo disco na época, que era o 'Ritual de lo Habitual'. Eu lhe disse: 'Bem, você sabe, pra mim esse álbum soa super produzido. Eu queria que a gravação ficasse mais crua'. E esse cara que me abordou na livraria era o escritor da coluna de fofocas da revista Bam, coisa que eu não sabia na hora. Foi quando ele escreveu na revista que eu disse isso, o que deixou Perry bravo e em algum momento Perry me disse que nós estávamos indo para uma reunião onde todos da banda estavam se reunindo para decidir se iriam ou não me expulsar do grupo... Foi muito estranho na hora".
"Been Caught Stealing" (2º disco, "Ritual de lo Habitual", 1990)
"Eu fui à reunião pensando que realmente iria ficar na frente de toda a gerência, das pessoas que mexem com dinheiro, do nosso produtor musical, Dave Jerden, e de toda a banda. Então, eu apareço sentindo ansiedade social sobre o que está acontecendo e o que está em jogo - e eles realmente estão todos lá. Eles começam a falar todo tipo de merda de negócios e isso e aquilo e então está feito. Nada acontece e todos nós fomos embora. Na saída, cheguei perto do nosso produtor e lhe perguntei: 'O que aconteceu com a decisão de eu continuar na banda?'. E ele me disse: 'Do que você está falando?' E eu respondi: 'Ah, deixa pra lá'".
"Mas no mundo de Perry, o golpe é outro. Poderia ser diferente como quando a MTV queria que fizéssemos o show acústico para a emissora, mas eu não queria. Parte da razão pela qual mantivemos qualquer tipo de credibilidade é que houve momentos chave em nossa carreira que realmente demonstramos quem éramos genuinamente. Há momentos em que sei que artistas assumem às pessoas que são realmente genuínos, mas não são. Eles estão sendo apenas estratégicos, mas o JANE'S ADDICTION não era assim. Era uma banda genuína, então, quando eu disse que achava que a MTV era ruim para a música em geral e que não queria ter nada a ver com eles, foi isso que realmente pensava e verbalizei para os outros. Perry queria fazer o acústico da MTV e Dave Jerden (produtor) e Stephen Perkins (baterista) provavelmente também queriam, mas Perry chegou até nós e disse: 'Eric não quer fazer isso, então, não faremos'. Todos entenderam que éramos uma banda e se um membro não quer fazer algo, não fazíamos, mesmo que isto significasse menos atenção comercial ou algo assim. Deixaríamos tranquilamente o dinheiro na mesa e iríamos embora".
"Naquela época, ser o único membro sóbrio de uma banda com tendências infames também pode ser engraçado vendo da minha perspectiva, como durante nosso 1º show no 1º Lollapalooza Festival em 1991. Estamos tocando, eu estou fazendo as minhas coisas, Stephen está fazendo as coisas dele na bateria, mas então, o som da guitarra se apaga, mas eu não olho para o palco porque o JANE'S ADDICTION é sempre caótico e eu estava acostumado com as pessoas pisando ou esbarrando em nossos equipamentos. Não penso duas vezes e continuo tocando olhando para baixo, apenas bateria e baixo tocando. De repente, a bateria para de tocar. Foi quando eu resolvo olhar para o palco e não há ninguém no palco comigo. Stephen se levantou e foi embora. Eu retiro meu baixo, dou de ombros para o público e vou embora também. Acontece que Dave e Perry brigaram depois de acidentalmente esbarrarem um no outro durante aquela música, sendo que eles caíram da rampa do palco brigando pelo chão".
"No final quando a banda acabou em 1991, eu me sentia tão alienado ao grupo e da experiência de tudo isso que envolve, então, aquilo tudo foi um alívio pra mim. Eu não tinha mais que lidar com o ressentimento óbvio e diário de Perry e sua comitiva e com o quão negativo tudo havia se tornado. Uma semana depois, fui para Big Sur, California, aluguei uma casa e fiquei por lá".
Quando as turnês de reunião começaram em 1997, eu não estava interessado. Eu vi que eles estavam fazendo um trabalho muito ruim, mas eu não queria comemorar o fracasso deles, assim como eu não queria vê-los indo muito bem. Então, eu simplesmente me afastei completamente até 2008, quando concordei em fazer um show no NME Awards como uma forma de homenagear o passado, e também porque a NME importava para mim, quero dizer, eu cresci amando as bandas inglesas que a revista NME cobria. Eu toquei uma noite e no dia seguinte nosso 1º agente e amigo de longa data da banda, Marc Geiger, me chamou para tomar um café".
"Fiquei sentado lá por 03 horas enquanto ele traçava um plano para o JANE'S ADDICTION. Ele fez parecer possível, dizendo que teriam outras pessoas interferindo em Perry para que eu não precisasse fazer isso, tipo, impedir que Perry fizesse covers ruins das músicas do JANE'S ADDICTION com sua banda paralela. Nosso agente descreveu a possível gravação de novas músicas produzidas por Trent Reznor (vocalista) e uma possível turnê com a sua banda, o NINE INCH NAILS. Tudo o que eu teria que fazer era tocar baixo. Eu disse que para fazer isso, voltar com o JANE'S ADDICTION, teria que haver novas músicas. Marc me respondeu: 'Sim, com certeza. Esse é o plano todo'".
"Eu concordei, mas quase desde o 1º dia o plano prometido não se materializou. Ele se tornou realmente ruim e as tentativas de novas músicas foram terríveis e depois fomos pegando outro caminho, mas eles me convenceram a persistir dizendo que poderíamos voltar para novas músicas e que era só fazer alguns shows antes. Colocar Perry na frente das pessoas para que ele tenha a sensação de que o público se importa com o que ele faz e depois nós dobraríamos este sentimento para voltar ao estúdio. Eu disse 'ok', mas isso não aconteceu".
"Os tempos mudam... O que não pode ser reconstruído sob demanda é inefável. Uma combinação de tempo e circunstância, de onde todos estão e como eles se juntam com uma energia em uma certa faísca. Nem o tempo que todos são levados a passar juntos trabalhando em tudo pode acontecer novamente do jeito de quando você era jovem. Você acorda e sai com seus amigos o dia todo e todos os dias, mesmo que seus amigos sejam irritantes ou meio loucos".
"Olhando para trás, para o JANE'S ADDICTION, muito da escrita e criação de músicas foram feitas quando as coisas estavam boas entre nós. Era competitivo em termos de tentar ocupar um espaço criativo, a sua ideia versus a ideia dele, também era procriativa e as músicas podiam vir de pontos aleatórios, pedaços e partes diferentes. O início de algo poderia ser de uma vibração, uma ideia ou uma única linha em uma guitarra que surgia na hora. Foi quando a nossa paleta foi criada e alguns desses componentes nascidos nos bons tempos não foram reunidos mais tarde, quando havia tensão na banda".
"Tenho pensado sobre tudo isso recentemente e conversado sobre isso com a minha esposa, Anabelle. Em uma noite dessas, assistimos o filme, Quase Famosos. Eu disse a ela que queria assistir de novo, porque da 1ª vez não tinha gostado do filme, mesmo quando todos ao meu redor gostaram. Eu só achei meio bobo, sabe? Toda aquela brincadeira de estar em uma banda... Mas o que eu disse à minha esposa depois que assistimos novamente foi que, no final das contas, eu gostei do filme. Eu disse que havia um ponto no filme em que a banda sobe ao palco pela 1ª vez e o garoto Cameron Crowe (diretor do filme, narrando sua própria história) está a reboque. A banda diz para ele esperar ali enquanto eles sobem ao palco e a câmera o seguem. Assistindo a isso, fiquei realmente comovido. É incrível que eu tenha conseguido fazer isso, ser o cara que sobe ao palco, faz barulho e as pessoas aparecem. Percebi que eu não tinha este sentimento quando era jovem, porque eu era muito distante, muito assustado ou muito fodido".
"Por exemplo, não houve holofotes em nós quando estávamos na capa da revista Spin. Eu me lembro que registrei aquilo como uma coisa legal que nós éramos, e eu lembro que era legal que tivéssemos também uma matéria no jornal LA Weekly, mas aquilo não caiu do jeito que cai nas representações de Hollywood. Não foi, tipo: 'Yeah! Nós conseguimos! Todo o nosso trabalho duro! Nós escrevemos as músicas e agora estamos aqui!' Eu não tive este sentimento, sabe? Talvez Perry tenha tido essa experiência, mas eu não".
"E agora, aos 58 anos de idade, voltei para o JANE'S ADDICTION. O que faremos? Haverá finalmente um momento de holofotes ou a coisa toda irá por água abaixo? Pra mim, no interesse da criatividade e de ter o inesperado na vida, é parte de uma reversão controlada das mudanças que fiz depois que fiquei sóbrio. Porque não ter nada a ver com drogas significava me livrar dos meus amigos mais próximos. Eu literalmente terminei a amizade com eles, mas agora, nesta era da minha vida, comecei a colocar essas pessoas de volta em minha vida. Percebi que, ao contrário de quando eu era jovem, não preciso mais sair com eles todos os dias. Não sou mais essa pessoa, não preciso disso de um amigo e eles não precisam disso de mim. Amigos dos velhos tempos são ótimos em pequenas doses, porque são malucos e trazem algo que você não encontra no shopping center, então, comecei a passar tempo com meus amigos loucos novamente, mas a cada 02 semanas em vez de todos os dias".
"E estou usando psicodélicos de novo, mas dessa vez como um adulto e no interesse da criatividade e cognição. Tenho um spray de ácido LSD, que não levei ao nível de derreter meu rosto. Meu objetivo é encontrar aquele ótimo momento em que as coisas começam a se ligar, onde tudo se torna um pouco mais brilhante e visualmente articulado. Quero chegar até esse ponto e ficar por lá. Essa é minha dose ideal, onde você está em um ponto elevado, mas ninguém saberia que você está sob efeito de LSD".
"Além disso, as necessidades do JANE'S ADDICTION são diferentes. No tempo em que não estive na banda, elas ficavam com cerca de 30% da potência. Versão 'Jane's on Ice', como diz um amigo meu. Veremos o quão perto de 100% podemos chegar e agora posso apreciar melhor os choques de estilos musicais entre nós, das minhas preferências pós-punk rock ao rock mais clássico de Dave Navarro. Agora, quando ele cria suas partes de guitarra que não são do meu gosto, ainda as quero lá na música. Talvez eu as odeie agora, mas as ame em 06 meses. E isso não é um projeto solo de Eric Avery. É uma banda com vozes diferentes... Acolho com satisfação a variedade de experiências".
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