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Soundgarden: "gostaria de lembrar a todos os nerds perfeccionistas da guitarra que ouçam o solo de Jimmy Page na música 'In The Evening'. Parece que a guitarra está caindo da escada e é brilhante"

by Brunelson

Kim Thayil, guitarrista do SOUNDGARDEN e 3rd SECRET, tinha sido entrevistado pela revista Guitar World e relembrou seus riffs e solos mais icônicos, bem como seus equipamentos e afinações que o guiaram profundamente em sua criatividade e jeito único de tocar guitarra.





Segue quase na íntegra essa matéria e entrevista:



Poucos músicos podem dizer que moldaram os anos 90 como Kim Thayil. Sendo um dos membros fundadores do SOUNDGARDEN, ele e seu grupo lançaram as bases para o que viria a ser conhecido como “o som de Seattle” e mais tarde conhecido como grunge ou rock alternativo, abrindo caminho para todo um movimento de conquista mundial que incluía nomes como NIRVANA, ALICE IN CHAINS, PEARL JAM, MUDHONEY, SCREAMING TREES e outros.


Normalmente visto com uma guitarra Guild S-100 preta em suas mãos e ocasionalmente também com uma Guild S-300, sua abordagem à guitarra tem sido incrivelmente multifacetada, com uma personalidade facilmente identificável em seus riffs e solos que variam do rápido e furioso ao condenado e esotérico. 


Neste sentido, ele foi e ainda é o pacote completo e uma inspiração para muitos.


SOUNDGARDEN, que se formou em 1984 e ficou em atividade ininterrupta até 1997 e que se reuniria em 2010, chegou a lançar seu 6º e último álbum de estúdio em 2012, "King Animal", antes da banda acabar em 2017 com o falecimento de Chris Cornell. O grupo ganhou destaque como aventureiros sonoros empenhados em experimentações sobrenaturais, usando harmônicos naturais e feedbacks para detalhar intrinsecamente seu ácido hard rock.


E embora eles tenham adotado uma série de afinações alternativas, é indiscutivelmente a afinação em drop-D que acabaria se tornando uma característica definidora para muitas bandas de guitarra rock dos anos 90.


Com a 6ª corda afinada na nota D para permitir acordes poderosos com apenas 01 dedo, seu som se inclinou para um turbilhão de ruídos mais carnudo e musculoso, inspirando algumas das músicas mais famosas da banda, como "Outshined", "Jesus Christ Pose" (ambas do 3º disco, "Badmotorfinger", 1991) e "Spoonman" (4º disco, "Superunknown", 1994), que se tornaram hinos grunge que não teriam soado exatamente igual se fossem criadas na afinação padrão.


“Não posso dizer que inventamos ou projetamos essas afinações”, disse Thayil enquanto tomava café em uma caneca branca em um dia úmido de verão em sua casa em Seattle. “Você ouvia histórias sobre músicos como Keith Richards (guitarrista do ROLLING STONES) tocando em afinação aberta e talvez usando apenas 05 cordas em vez de 06. Também me lembro de ter lido sobre o KISS abaixando suas guitarras meio tom e percebendo que muitos músicos de rock estavam fazendo isso depois”.


Ele mesmo admite que suas primeiras aventuras na afinação em drop-D foram “meio estranhas”. No início, ele se perguntava por que os guitarristas escolhiam propositalmente tocar um instrumento afinado incorretamente, pelo menos no sentido convencional. E então, é claro, aqueles momentos luminosos a partir dos quais ele construiu uma carreira começaram a chegar de forma intensa e rápida.


“Quando você está aprendendo, você começa a se orientar para o que lhe dizem ser correto, mas depois segue em frente e se liberta dessas restrições”, disse Thayil. “Sim, existe uma regra prática comum para afinar guitarras, mas existem outras maneiras de abordá-la para facilitar a execução ou a escrita, ou mesmo apenas para alterar o tom. Você afrouxa uma corda e obtém um tipo de som diferente, com isso, você pode dobrar mais as notas graças à flexibilidade extra que ganha”.



Jornalista: Quase parece que músicas como "Outshined" simplesmente não existiriam na afinação padrão...


Kim Thayil: Heavy metal e afinação em drop-D são uma combinação perfeita… Simplesmente funciona, sabe? Chris Cornell começou a diminuir ainda mais sua 6ª corda para afinação em B, escrevendo músicas como "Rusty Cage" durante a era do álbum "Badmotorfinger". Ao fazer isso, poderíamos aumentar a oitava avançando um passo inteiro na próxima corda, o que parecia muito legal! Então, mexer nas afinações definitivamente gerou muita coisa.


Thayil: Foi bem nessa época quando o nosso baixista, Ben Shepherd, entrou na banda e ele tinha experiência em música country com algumas afinações abertas e deslizantes. O nosso baterista, Matt Cameron, começou a escrever coisas em afinações estranhas também, como a canção "Birth Ritual" (ficou de fora do 3º disco), que tinha a 6ª e a 5ª cordas desafinadas. Estávamos estimulando um ao outro a diferentes maneiras de pensar. A coisa da afinação drop-D se tornou muito importante para nós e depois para outras bandas de Seattle, como NIRVANA e ALICE IN CHAINS. Depois, SMASHING PUMPKINS também estava fazendo coisas semelhantes.


"Outshined"


Jornalista: Você tem uma forte identidade como guitarrista solo, misturando elementos da pentatônica do rock clássico com ideias mais atmosféricas que parecem capturar um momento no tempo.


Thayil: Isso é o que deveria ser a conclusão da coisa e não quantas notas foram tocadas, onde elas caíram e por quê. Se for essa a pergunta, minha resposta seria: ‘Não sei. Aqui está um livro pintado por números e símbolos para você entender’. Claro, há algumas músicas em que você tem que escrever uma parte que seja melódica e enfatizada, para complementar aos vocais ou ao riff, mas gosto da ideia de chegar à seção do solo e ver as coisas desmoronarem, como um carro saindo da beirada de um penhasco de uma forma perigosa ou algo realmente barulhento e inexplicável. Gosto de fazer as pessoas pensarem: "Mas que porra está acontecendo aí?”



Jornalista: Os guitarristas que vieram depois de você, incluindo Adam Jones do TOOL e Jonny Greenwood do RADIOHEAD, também mostraram aquela abordagem esotérica em seus solos, quase como se estivessem pintando quadros com suas guitarras.


Thayil: Totalmente! É uma espécie de pintura apenas com cores sonoras. A música deve ser evocativa. Há algo unidimensional em fazer com que as notas ocorram linearmente e em série... Pode ser atraente e representar algo até certo ponto, fazendo você pensar: "Que série interessante de notas e intervalos", mas em termos de humor, você pode criar ideias mais emotivas libertando-se disso. O solo é sombrio, estranho, edificante ou casual? Você pode aproveitar todas essas coisas. Adam Jones e Jonny Greenwood são belos exemplos de guitarristas que prestam um serviço incrível à música, escolhendo sons emotivos e coloridos.



Jornalista: O que você lembra da gravação da música "Black Hole Sun" (4º disco) do SOUNDGARDEN?


Thayil: Me lembro de quando ouvi aqueles pequenos arpejos nas seções dos versos e pensei: “Isso não é estilisticamente típico de mim”. Parecia mais uma parte de piano ou como pequenas fadas e anjos dançando na cabeça de um alfinete. Eu pensei: "Não sei, cara… É muito cristalino pra mim". Obviamente, acabei tocando essa parte de guitarra nos shows, mas esta canção geralmente sempre ficava no meio do setlist, quando eu já tinha tomado algumas cervejas. Foi realmente uma mudança de rumo, passando de tocar rápido e livre para: "Hmmm, vou ter que tocar todas essas notas no lugar certo agora".


Thayil: Quase parecia que eu tinha que puxar um banquinho e ficar sentado ali tocando guitarra com as pernas cruzadas. Eu tive alguma resistência a essa parte dos versos... Na gravação, acho que toquei apenas as partes do refrão e os solos. Chris queria que eu tocasse nos versos, mas aqui está o problema… Há uma caixa Leslie nessa gravação, tipo, se você parar ou errar, não há como eles te devolverem exatamente onde você estava. Foi tão frustrante e por fim eu me virei para Chris e disse: "Você escreveu esta parte, então, você provavelmente pode ir mais longe do que eu”.



Jornalista: O solo parece capturar bem esses diferentes lados de você. É frenético e ambicioso, quase destruidor em alguns lugares, mas também abstrato até certo ponto.


Thayil: Sou fã da banda CREAM e nas primeiras turnês europeias do SOUNDGARDEN tocávamos o cover da música "Sunshine of Your Love" no final dos shows, principalmente porque estávamos bebendo durante toda a apresentação. Todos nós da banda amávamos esta canção, assim como todo o disco em que ela foi lançada, "Disraeli Gears". Meus amigos que gostavam mais de tocar blues e soul music, definitivamente queriam que eu tivesse diminuído o ritmo do meu solo na música "Black Hole Sun", mas penso que o que fiz foi comovente… Só não é blues.


"Black Hole Sun"


Jornalista: É o 30º aniversário do álbum "Superunknown" em 2024. Músicas como "Let Me Drown" e "Mailman" possuem uma sensação quase inebriante de arrasto.


Thayil: Chris Cornell escreveu aquele riff de abertura da canção "Let Me Drown" e eu adicionei as harmonias. Eu costumava gostar de incluir coisas assim porque pareciam um pouco pervertidas (risos). Já o riff da música "Mailman" foi um dos que Matt Cameron escreveu. Ele é muito atento quando se trata de diferentes andamentos e é uma das 03 ou 04 músicas do álbum que Chris não tocou guitarra. Para as gravações desse álbum eu estava tocando com uma guitarra single-coil, uma Fender Stratocaster e uma Gibson Les Paul, que eu afinava de acordo com o que Matt havia escrito. Acredito que para a música "Mailman" foi na afinação padrão, mas com as 02 cordas mais graves reduzidas para as notas C e G. Temos muitas músicas em afinações estranhas e é por isso que fazíamos turnês com tantas guitarras, tipo, levava umas 08 ou 09 guitarras só pra mim, porque a cada poucas músicas precisávamos mudar a afinação.


Thayil: É estranho que eu tenha escolhido usar outras guitarras em vez da minha da marca Guild, mas então, quando fomos gravar a canção "Superunknown", eu voltei para a minha Guild e Chris estava tocando com sua guitarra Gibson Les Paul. Já a música "Fell on Black Days" pode até ter sido Chris tocando em sua guitarra Gretsch... Pensávamos que músicas diferentes precisavam de cores diferentes.


"Let Me Drown"


"Mailman"


"Superunknown"


"Fell on Black Days"


Jornalista: O que te atraiu na guitarra Guild S-100?


Thayil: Eu tinha encontrado uma guitarra Guild de 2ª mão e que ainda estava acessível. Tinha acabamento na cor preta e acho que comprei ela por cerca de U$ 235 dólares quando tinha 18 anos de idade. As guitarras novas naquela época estavam fora do meu orçamento, então, tive que dar uma olhada nos modelos usados. Essa estava em boas condições e com uma cor bonita. Tinha peculiaridades também, por causa daquela área dela atrás da ponte. Os captadores eram um tanto microfônicos, então, você receberia um feedback bem legal. Ela realmente não gritaria, a menos que você soubesse como, mas você ouviria um zumbido agradável que ela emitia. Se você ficasse perto do amplificador, poderia coordenar aquele zumbido e também havia algo legal nela ao fato de ser um pouco mais leve.


Thayil: Eu também poderia fazer todas aquelas poses legais como o guitarrista Ace Frehley fazia no KISS por causa da guitarra Guild ser mais leve, mas admito que não fiz aqueles poses porque ainda estava ocupado tentando aprender o que tocar e não errar.



Jornalista: Você ainda usava amplificadores de guitarra da marca Peavey ou já havia mudado para Mesa/Boogie a essa altura?


Thayil: Na verdade eu não sei... Houve uma transição naquela época porque eu estava usando os amplificadores da Peavey em torno da época de gravação do álbum "Badmotorfinger". Principalmente porque nós os endossamos e a Peavey nos deram muitos amplificadores para as turnês. Tinha momentos em que quebraríamos os nossos amplificadores ou às vezes pegaríamos uma válvula emprestada de um cabeçote e colocaríamos em outro. Para o álbum "Down on The Upside" (5º disco, 1996), com certeza já estávamos usando Boogies, mas às vezes eu também gravava com um cabeçote Music Man ou um Fender.



Jornalista: Músicas como "Spoonman" e "4th of July" (ambas do 4º disco) também se tornaram as favoritas dos fãs dessa era do SOUNDGARDEN, mas por razões muito diferentes.


Thayil: A canção "Spoonman" era crocante e visceral. Tinha aquela sensação percussiva com Matt Cameron direcionando esse peso. A música "4th of July" não foi tão percussiva, mas tinha um elemento mais pesado que dependia mais do ambiente acústico. Foi uma música difícil de gravar por causa da sua afinação. Tivemos que usar cordas muito grossas que interfeririam na forma como eu gostava de tocar, em termos de fazer os bends e vibrato com os dedos. Cordas mais grossas são um pouco mais resistentes e conseguem segurar melhor a afinação, mas elas ficam afiadas quando você aperta o braço da guitarra com muita força... Foi difícil de gravar, pois você pensaria que tinha entendido a canção e depois iria ouvi-la novamente como tinha ficado para descobrir que as guitarras estavam um pouco "fora de moda".


"Spoonman"


"4th of July"


Jornalista: Olhando para trás agora, de quais músicas você mais se orgulha?


Thayil: Minha resposta muda toda vez que sou perguntado sobre isso... A canção "4th of July" possui essa melodia que dobrei uma oitava acima. Parece muito murcha e melancólica, mas há algo nela que é realmente simpática e triste, especialmente em seu riff sombrio. Poderia ter sido mais caótica ainda e mais reconhecível, como se eu estivesse jogando um monte de tinta contra a parede… Mas era necessário algo assim da forma que ficou gravada, uma música escrita no contexto das letras.


Thayil: Depois, tem a canção "Like Suicide" (4º disco), que possui uma espécie de caos frenético com um senso de melodia também. Muitos dos meus solos são assim, uma combinação de escalas com diferentes tomadas ao mesmo tempo, tipo um Frankenstein. Eu estava explorando as letras e a tristeza da música para criar este solo, que tem uma vibração tipo a música "Dear Prudence" dos BEATLES. Quando o solo chega, não é um choro, mas sim, gritos e lamentos. É como uma explosão inconsolável de lágrimas.


"Like Suicide"


Jornalista: Para finalizar, quais os guitarristas que você acha que mais impactaram você e de que forma?


Thayil: Gostaria de lembrar a todos os nerds perfeccionistas da guitarra que ouçam o solo de Jimmy Page na música "In The Evening" do LED ZEPPELIN. Parece que a guitarra está caindo da escada e é brilhante. Eu me lembro das pessoas escrevendo sobre isso no final dos anos 70 nas revistas se perguntando: "Ele pretendia ferrar tudo mesmo de propósito?" E eu pensava: "Cara, isso ficou muito legal!"


Thayil: O mesmo vale para Jimi Hendrix com todo aquele feedback que ele fazia. Hendrix estava sempre se esforçando e fazendo as pessoas se perguntarem: "Por que ele escolheu seguir por esse caminho?" Ele não tocava as coisas da mesma maneira todas as vezes porque isso vinha do seu coração, não de notas ou de algum livro didático. Ele estava vivendo, pensando e sentindo. O feedback estava em todo lugar na sua música e fazia parte da sua paixão e intensidade… E muito disso alimentou o que eu estava tentando fazer no SOUNDGARDEN”.


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